DIREITOnews | Deveres das concessionárias de serviços públicos
- Eduardo Antunes - Advogado
- 20 de fev. de 2018
- 3 min de leitura

Com a chuva sem precedentes que aterrorizou os cariocas recentemente, inúmeros problemas foram experimentados pelos cidadãos da Cidade Maravilhosa, sobretudo quanto à interrupção de serviços públicos, dentre eles energia elétrica e telefonia.
Diante de casos como esse, os usuários, repletos de reclamações e anseios não atendidos, devem conhecer os direitos e deveres que regem a relação de consumo havida entre concessionárias e consumidores.
Os serviços públicos podem ser prestados diretamente pelo Estado ou por particulares, através do instituto jurídico da delegação, que se divide em concessão, permissão e, para alguns doutrinadores, autorização.
A Lei no 8.789/95 rege o regime de concessão e permissão da prestação dos serviços públicos, conforme previsto no art. 175 da Constituição Federal e, por ser lei específica, se sobrepõe (mas não afasta a incidência) ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), conforme já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Então, antes de bisbilhotar o CDC, é bom dar uma olhadinha nessa lei.
O art. 6o da referida norma traz previsões sobre a adequação do serviço, determinando que os préstimos públicos observem os princípios da regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia e modicidade nas tarifas. No mesmo sentido, o CDC diz, em seu art. 22, que os órgãos públicos e os delegatários são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. E é justamente nos serviços essenciais que residem as maiores controvérsias.
A Lei no 7.783/89, que regula o direito de greve, define, em seu art. 10, quais são os serviços essenciais. São eles: tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; funerários; transporte coletivo; captação e tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo; compensação bancária. Portanto, água, luz e telefone,ofertados por concessionárias, são essenciais.
Nessa linha, seguindo o raciocínio literal dos dispositivos legais, as concessionárias não poderiam interromper o fornecimento dos serviços, eis que devem ser contínuos. Mas vocês lembram da Lei no 8.789/95? Aquela que, segundo o critério da especialidade, rege a delegação dos serviços públicos. Pois é! Ela traz ressalvas.
O art. 6o, § 3o dita que “Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando a) motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; b) por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade”. Portanto, nesses casos, pode haver a interrupção dos serviços.
Especificamente no que diz respeito à energia elétrica, a Resolução Normativa no 414/2010 da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), em seu art. 170, diz que o fornecimento do serviço deve ser suspenso em casos de emergência. Por outro lado, o art. 176, determina os prazos para a religação da energia, variando de 4 (quatro) a 48 (quarenta e oito) horas, a depender da classificação da unidade consumidora. Entretanto, o prazo é contado da solução do problema que gerou a interrupção. Por óbvio, a razoabilidade deve nortear o atendimento ao usuário, sob pena de configurar-se abuso por parte da concessionária, que poderá ser responsabilizada.
É claro que, caso o consumidor se sinta lesado, pode fazer reclamações nas ouvidorias ou buscar a indenização de eventual dano material ou reparação por dano moral sofrido, nas linhas do art. 6o, VI e VII do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Conquanto exista a proteção legal, vale dizer que o art. 210, da Resolução exclui a responsabilidade das concessionárias de energia por danos elétricos em algumas hipóteses, dentre elas emergências e calamidades, como ocorrido na última semana.
Em suma, como é comum na Ciência Jurídica, a confrontação de princípios protetivos e princípios limitativos aos direitos dos consumidores deve ser resolvida com a técnica da ponderação. Em palavras mais simplórias: a concessionária deve indenizar os danos causados pela interrupção dos serviços, salvo se comprovar alguma excludente de responsabilidade prevista na legislação.
Evidente que a interrupção de um serviço essencial causa transtornos a todos, mas é preciso entender que contra determinadas manifestações da natureza, nada podemos fazer senão adotar medidas colaborativas para evitar e/ou remediar as consequências das catástrofes.
Dúvidas e sugestões? Escreva para mim através do meu e-mail (eduardolmantunes@gmail.com).
Eduardo Antunes é advogado e professor. Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Gama Filho, pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Gama Filho e pós-graduado em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes.